UM DESERTO AVERMELHADO, A POEIRA CONTAMINANTE E ALGUNS SOBREVIVENTES É O QUE RESTOU

Um deserto a perder de vista, e agora restam apenas os escombros para um outro começo. Tudo tem a cor avermelhada da lama, a não ser o céu imponente que insiste em anunciar que ainda há vida. É preciso confiar na vida. Naquela imensa área destinada à disposição de resíduos sólidos da maior refinaria de alumina (óxido de alumínio) do planeta, a Hydro Alunorte, até a poeira exala a urgência de se enfrentar o colapso civilizacional materializado pela política mineral no Brasil e no mundo. A mineração não pode significar o fim dos tempos.
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Conhecemos instalações da MRN (Mineração Rio do Norte), em Oriximiná, onde está em funcionamento a maior mina de bauxita do Brasil e a terceira maior do mundo, e depois fomos a Barcarena, onde opera a Hydro Alunorte. A bauxita é o minério do qual se produz a alumina, principal matéria-prima do alumínio.

Nas duas cidades, ouvimos relatos de lideranças de comunidades atingidas há décadas por esses empreendimentos. A contaminação das águas, do solo e do ar é um dos graves problemas sofridos por essas populações, que tiveram seus modos de vida devastados e estão sujeitas a doenças de pele, respiratórias e outras decorrentes da exposição a metais pesados. A luta incansável dessas pessoas é um apelo por voz, para que suas realidades sejam visibilizadas, para que o modelo predatório da mineração seja transformado. 

Foi necessário estar diante do Seu Manduca, liderança do quilombo Boa Vista, o primeiro território quilombola titulado do Brasil, situado abaixo das barragens da MRN, e vê-lo denunciar que usa muletas para se locomover porque seu corpo foi contaminado por uma bactéria. Ele contou que resolveu estudar direito ambiental e que seus filhos também estão se especializando no tema para que a sua comunidade tenha mais condições de continuar lutando. No dia seguinte, silenciamos com o choro de Cleide, moradora da Vila do Conde, dentro do Polo Industrial de Barcarena, que nos disse não aguentar mais enterrar familiares que morrem aos poucos por causa da contaminação. 

São histórias de sofrimento e resistência que se entrecruzam com tantas outras semelhantes na busca inglória por justiça socioambiental no nosso país. 

Como dormir com tamanha ameaça? Esse tem sido o cotidiano de comunidades aterrorizadas pela lama invisível de barragens que estão em nível máximo de alerta. Centenas de pessoas já foram retiradas de suas moradias nas localidades mineiras de Macacos, Barão de Cocais, Itatiaiuçu e Ouro Preto, além de outros lugares que poderão entrar na rota de emergência a qualquer momento. 

Para que essas criaturas tenham o valor inestimável das suas vidas e os seus direitos assegurados, só nos resta vislumbrar o que sobrou do céu, para ficar nas palavras do inesquecível poeta Marcelo Yuka, e construir alternativas de transição rumo a outro projeto político-econômico em que todas as vidas possam coexistir com igual valor.

Comentários

  1. Chegamos a conclusão, que a mineração no Brasil nunca será uma atividade totalmente
    sustentável e sempre irá ceifar vidas inocentes perante o agente perturbador dos seus
    sonhos gerando o pesadelo que silencia para sempre-a morte.

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