O QUE OS MEUS OLHOS AZUIS DIZEM SOBRE MIM.

Me foi concebida uma herança genética advinda de minha bisavó Amélia, a única que tinha olhos azuis na família. Provavelmente, meus pais teriam os genes recessivos dessa cor de olhos, ocultos em seus genótipos, e nessa condição, a cada quatro filhos, as chances seriam de ter um com olhos-azuis ( 25% de probabilidade).

Julgo ter sido um daqueles "milagres da sobrevivência na natureza", por ter nascido em 1958, em uma maternidade sem incubadora, aos sete meses de gestação e enrolado em chumaços de algodão, recebia a visita e monitoração de minha mãe diariamente para somente depois de quase dois meses sair da maternidade. Eu vinguei.

                                                           

Pode ser muita coincidência, mas meus olhos são da cor da Oxum que corresponde a Nossa Senhora da Conceição na igreja Católica com sua imagem de manto azul. Surpreendentemente, faço aniversário no dia dessa Santa, 8 de Dezembro. Na natureza, a Oxum representa as águas correntes das cachoeiras, que escorrem como o choro da Santidade que lavam e carregam nossos pecados. Em alguma cachoeira, seus devotos sentem sua energia celestial e deixam suas oferendas.

Essa fé inabalável se materializa como um binóculo de longo alcance, consigo ter a percepção necessária para interpretar os fenômenos e fatos científicos e admitir, depois de estudar e buscar mais conhecimento em mais de uma centena de cursos, algumas verdades que muitas pessoas custam a admitir ou não têm coragem de dizer, como por exemplo, a perda drástica de biodiversidade já nos anos 70, quando a industrialização estava no auge contribuindo para a poluição do ar com queima desmedida de combustíveis fósseis ( carvão e petróleo).  A partir dai, piorou ainda mais com as queimadas e desmatamentos, as florestas na Europa viraram pó, e hoje os fragmentos anunciam o que já fora um dia, verdejante.

Hoje me defino como um cientista-cidadão e meus alunos certa vez me deram de presente uma estatueta de um pescador sentado em uma pedra pescando, me postularam, dizia a mensagem: "professor Cyro, nosso incentivador, "O pescador de ilusões". 

Meus olhos-azuis viram a natureza definhar, não há quase borboletas, não vejo pardais como antes, o solo sem minhocas. Só avisto pombos e mosquitos nas cidades cada vez mais congestionadas de pessoas e veículos. Perdi a conta de quantos cadernos universitários enchi de anotações que depois de algum tempo eu mesmo jogava fora. Isso me ajudou a dar conta da minha inquietação e vontade de melhorar o mundo. Como eu era participante do Greenpeace, pude escrever uma carta-mensagem ao embaixador da França no Brasil, pedindo para cessar os testes nucleares no Atol de Mururoa, época dos 50 anos da bomba de Hiroshima. O abaixo assinado foi um marco na minha vida.

A meu ver, a vida é assim, coisas tão simples e banais para as pessoas, podem ganhar relevância ou significância para um pequeno grupo se tiverem atreladas a um valor estimativo ou emocional.

Ser estudioso foi mais que uma necessidade profissional, levei o passar dos anos, querendo aprender e esse hobby me fez "Um rei, onde meus súditos sempre foram meus pensamentos". Ao lado dos meus belos olhos-azuis, já calejados, ganhei ao redor de cada olho, uma verruga e uma visão embaçada, mas é tranquilo e normal,desejo manter essas "pegadas em meu rosto" para me lembrar que um dia fui selecionado para ser pesquisador da FIOCRUZ e no governo Sarney, o projeto que seria desenvolvido, foi extinto antes da minha contratação e por falta de verba o meu sonho se esvaiu, lembro que chorei muito.

Continuei lecionando no ensino público do Estado do Rio de Janeiro ( Municipal e Estadual), Até dei aulas na Universidade Estácio, como convidado, mas me dediquei à Ciência por paixão e pura filantropia, na pandemia fiz cinco cursos EAD em universidades pelo Brasil, Me sinto totalmente realizado, 40 anos de casado, um casal de filhos e agora minha filha me deu uma netinha muito querida. As vezes, penso que estudei muito, como uma fuga da realidade, para preencher o vazio de ver o magistério público no Brasil, de modo geral, tão desprestigiado, como no caso do Rio de Janeiro.

Os astronautas dizem que a Terra, do espaço cósmico, é azul. Mas, uma razão buscar inspiração e parafrasear o cantor "TIM MAIA" quando diz: "Quero ver o mundo todo azul. Azul da cor do mar". Com meus olhos-azuis.